Eu te sinto, Eu te somos.

Eu te sinto. Não vejo, mas sinto. Estás escondido, mas algumas coisas não te deixam passar-se despercebido. Presente em coisas grandiosas, mas grandiosamente presente nos detalhes quase imperceptíveis. Venha, pode vir à tona, não se aflija com as ameaças que a luz faz a seus olhos. Deixe que ela penetre por eles e chegue a mim. A mim? Sim, a mim. Você sou eu. Você é meu escudo. Você sou eu subterfúgio. Você sou eu, ou eu te sou? Depende. Depende da coragem. Às vezes eu te sou. Me escondo, deixando transparecer meu eu apenas nos detalhes. Havia também vezes em que você me era. Surgia, enfrentava a luz que o cega e deixava o mundo enxergar o que teus olhos viam. Mas agora estás aí, recluso. Estamos, pois nesse momento eu te sou. Estou presa contigo. Estamos nos escondendo do que está lá fora. Deixamos nossos anseios pra trás. Ou eles nos deixaram? Talvez tenhamos sido abandonados por esperar demais. Com medo do medo deixamos de sonhar. Deixamos nossas vontades pra trás por desassossego com o mundo lá fora. Por que, amigo? O que somos, o lá fora ou o aqui dentro? Diga, somos o aqui dentro. Então por que deixamos com que o lá fora nos invadisse? Pior. Não deixamos ser invadidos e nem tentamos invadir o lá fora. Nos escondemos. Estamos aqui, trancados e sendo amedrontados pela luz e pela ameaça de invasão. Mudou o lá fora? Não. O lá fora te mudou. Nos mudou, afinal, já sabe. O lá fora nos mudou porque deixamos. O lá fora nos mudou porque permitimos que a invasão nos alcançasse. E o aqui dentro, onde está? Estamos no aqui dentro. Estamos presos em nosso interior. Estamos aqui, brindando com nossos sonhos e ideias. Poético, não? Não. Poético seria deixá-los invadir o lá fora. Só assim teriam chance de sobreviver, realizar-se, desdobrar-se. O que nos invadiria seriam apenas as realizações. Mas não, eles estão aqui conosco, e nós todos estamos presos na redoma que construímos com medo da invasão. Tivemos medo de mudar o lá fora, mas o lá fora não hesitou em causar-nos mudança. Me diga, amigo, novamente. Somos o lá fora ou o aqui dentro? O aqui dentro. Sim, amigo. Somos o aqui dentro, mas não devemos habitar aqui. Vamos desconstruir essa redoma. O lá fora não vai nos invadir se o aqui dentro passar a nos habitar, e não o oposto. Sim, o aqui dentro deve nos habitar e nos preencher, nos tomar, nos invadir e nos transbordar. Não tenhamos medo do desassossego do lá fora. Vamos apenas ser o aqui dentro. Se o lá fora não gostar, que se enclausure. Vamos invadi-lo, jamais o oposto.  Vem comigo, vem me ser? Vamos.  Deixa chover essa redoma. Após a chuva nosso eu será o arco íris. Venha amigo, venha à tona. A luz não mais nos cegará, estamos unidos, já posso ver pelos seus olhos. Nem mais te sou nem tu me és. Apenas somos. Não me é mais subterfúgio, pois não queremos mais nos esconder.  Somos sem escudo, sem redoma, sem proteções. Deixamos o esconderijo do aqui dentro e agora ele habita dentro de nós. E está vivo, pulsante. Nossos sonhos agora brindam o “nós”. Brindam por nós, se alimentam do “nós”.  Nem eu te sou nem tu me és. A luz penetrou por seus olhos e chegou a nós. E não foi invasão, só chegou porque permitimos. O lá o fora? Ele que se invada conosco. Se invada de nós. Eu te sinto. Te sinto e agora te vejo. Eu te sou amigo, eu te somos. Diga amigo, novamente, e o lá fora? Ele que se invada conosco. Ele que se invada de nós.

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