Verbo intransitivo ou
intransigente? Finito ou infinitivo? Presente ou mal passado ou futuro incerto
de pretéritos? Primeira pessoa do singular ou pessoa de quinta num plural
devaneio de ilusões? Se eu me mantivesse no subjuntivo, se eu permanecesse em
dúvidas, se eu continuasse nesse limbo de incertezas, de desatitudes, de desfazeres, eu poderia estar largando esse gerúndio
eterno de quase-ideias, quase-fatos, quase-sorrisos, quase-amores, quase-vida.
A única completa é a lágrima, no seu modo indicativo. Aquela que é, vem, molha,
escorre, rasga, corrói e seca. Porque não tem força pra ser imperatriz, pra ser
imperativa. E quando o sentimento se faz sujeito oculto, verbo irregular, os
olhos transbordam a presença impessoal do vazio. Quando o vazio impera, a
realidade segue sem concordância com os sonhos e a regência some num
descompasso que impede a fluência da fala. Cala. Refaz-se na mesóclise o esconderijo
do sentimento, ali guardados como desinências o medo e a descrença, esperando um
vocativo doce que o liberte. Que o ensine a verbalizar os sorrisos, antes que
as lágrimas falem por si só. Antes que, nessa luta por um eu em voz ativa, minha gramática lance mão das exceções e me impeça
também de ser a partícula apassivadora do desejo de nós. Já que na realidade, eu sou o sujeito, mas não tenho
predicados. E quando durmo, retiro a transitividade do meu eu pra ser apenas
sonho. Nos sonhos, eu já começo pelo tu
vives. Porque o eu eu já não
tenho certeza. E então ele vive, e
pulo o nós, porque ele está atado tão
forte que nem se solta nem me diz o que anda fazendo. Se é que ele ainda
existe, ou um dia possa existir. Pode ser apenas o eu perdido contigo. De
mãos dadas, atadas, amarradas em nós. Em nós.
E no mais, vós podereis viver em paz,
se o nós não lhe significar muito.
Enquanto que eles sim, vivem, cantam.
Sem nós. Só eles, que cantam e sentem. Pra eles, está tudo já escrito, já traçado: amem. Amém. E pra nós?
Tenho medo de desfazer a metade e sobrar apenas um nó. Porque você ainda é a
primeira pessoa do meu plural. E sem o nós,
meu presente some. Vou viver entre o que era perfeito e o que podia ser
mais-que-perfeito. Numa eterna imperfeição por ter-me corrigido da sua
conjugação.
(com Ariane Harbekon)
(com Ariane Harbekon)
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