Corações selvagens não podem ser domados. O meu talvez não
tenha a riqueza da coragem para ser nomeado selvagem, mas tem a fragilidade do
desejo de ser livre. E dessa forma é
também indomável. Inapreensível. E livre. Livre do peso das certezas. Livre das
imposições alheias. Ele caminha por si próprio, rumando sem rumo, remando sem
prumo num mar baldio de sentimentos. Caminha livre procurando livrar-se de quem
se prendeu a ele, deixando pra trás os débitos dos antigos habitantes que nele,
um dia, encontraram morada. Moraram. Marejaram pelas águas vermelhas que por
ele correm. Hoje, deságuam pelas quedas que despencam do olhar. Quedas d’água.
Quedas mágoas. Quedas tréguas que permitem escorrer quem não mais mareja aqui.
E aí, deságuam. Desabam dos olhos o que minha morada pulsante não permite mais
habitar. Fechou-se. Estancou-se dos sangramentos. Saturou-se dos cortes e hoje
busca a sutura capaz de fechar os portões de casa. Venderemos a propriedade,
vamos morar de aluguel. E quando algo impedir-me de pagar a estadia em suas
águas, seguirá também eu sem morada, até que sua maré me leve pra longe
encontrar a praia. Sairei por olhos marejados. Seguirei também desabando pelos
olhos alheios. Ou caindo de sorrisos felizes por me verem partindo. Não
importa. Essa morada em hipertensão só quer se ver livre da prisão. Segue com a
fragilidade do desejo de ser livre, reformando a casa em que muitos não
souberam habitar. Dele saem marcas em barcas carregadas dos que sairão pelo
olhar em deságue. Partem dos olhos marejados que os vê marejar oceano a fora
encontrando outras marés. Que a brisa o leve para onde deseja. Eu? Eu sigo
remando por um coração amando ser livre. Não. Não mais farei dele morada. A
cura foi demorada, fizemos a escolha errada e agora é preciso ir. Segue pulsando
e livrando, remando seu amando para longe daqui.
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